29 de setembro de 2011

Realidade, ficção e pirataria


Fazia tempo, um bom tempo, que não sabia o que era passar quatro horas em uma sala de aula. No começo do mês relembrei durante um curso de verão chamado “Realidade e ficção portuguesa no século XX”. Foram duas semanas, seis aulas, seis autores, 11 livros. Éramos quatro estrangeiros (outra brasileira, uma italiana e um catalão), quatro senhoras e uma moça portuguesas, além da também portuguesa professora, claro.  

Poderia falar do humor e sensibilidade do Almada Negreiros em A invenção do dia claro, da descoberta de Herberto Helder e seu belíssimo Os passos em volta, da literatura político-surrealista de Mário-Henrique Leiria e de seus Contos do Gin Tonic, mas, para além disso, há o fato de que cada aula era uma oportunidade de ouvir os portugueses – as portuguesas, melhor dizendo – falar imenso. Suas expressões, como estruturam as frases, como pensam, o que ignoram. Então, mesmo quando a professora se perdia, fugia do tema, lá estavam as anedotas, a história do país, as histórias de cada uma, os causos. Meus preferidos envolvem “O” escritor português – que, vejam só, é anterior ao século XX, não constava do currículo.

Pois o senhor Eça de Queiroz estava em Bristol escrevendo Os Maias. Enviava, então, por correio, os capítulos a Lisboa para serem revisados. O tempo passava e nada do retorno dos textos, nada de o livro sair. Eça pede a um amigo que intervenha e acaba por descobrir o problema: um tipógrafo estava a fazer cópias piratas e enviá-las ao Brasil. Sim! A primeira edição de Os Maias publicada foi uma versão pirata vendida no Brasil, onde Eça já era um enorme sucesso.
Isso é o que eu chamo de pioneirismo.

*continua amanhã


Nenhum comentário:

Postar um comentário